Depois de Cê (2006), o álbum de maior inovação estética e vibração da trilogia, e Zii e Zie (2009), o cantor e compositor Caetano Veloso, 70 anos, lança um terceiro trabalho com a BandaCê, Abraçaço (Universal Music), e fecha um ciclo com os jovens músicos cariocas.
Na companhia do baixista e tecladista Ricardo Dias Gomes, do baterista Marcelo Callado e do guitarrista Pedro Sá, que dividiu a produção da trilogia com Moreno Veloso (filho do cantor baiano), Caetano renovou a sua musicalidade de uma maneira que não ocorria desde o começo da década de 90.
O mergulho na sonoridade roqueira experimental, com bom trabalho de Pedro Sá na guitarra e arranjos fugindo do formato tradicional de canção, gerou transrocks e transambas vigorosos como Odeio, Rocks e Musa Híbrida. Cê, em especial, se transformou no melhor disco de Caetano Veloso desde Circuladô, de 1991.
Guardadas as devidas diferenças – inclusive, de épocas – e mesmo que todas as composições sejam de sua autoria, Caetano criou com a BandaCê uma sonoridade tão cheia de identidade quanto a produzida com A Outra Banda da Terra nos anos 70, quando ele gravou pérolas como Cinema Transcendental, de 1979.
Passado o frescor dos dois primeiros trabalhos da parceria com Pedro Sá, Ricardo Dias e Marcelo Callado (que lançou um bonito disco recentemente com sua mulher, a cantora Nina Becker: Gambito Budapeste), Caetano encerra o ciclo de roqueiro alternativo casando o seu apreço tradicional pela batida do violão com guitarras distorcidas.
Trabalho de maturação entre as vibrações de Cê, mais transrock, e Zii e Zie, mais transamba, Abraçaço abre seu repertório de 11 músicas com o impacto de A Bossa Nova É Foda. Na canção, Caetano Veloso constrói uma ligação entre João Gilberto, “o bruxo de Juazeiro”, e lutadores brasileiros do MMA como Júnior Cigano e Anderson Silva.
Ou seja, uma relação entre um gênero musical eternizado como algo sofisticado e suave, e um espetáculo esportivo de porrada e sangue. Assim como a arte de João, o MMA se transformou num produto de exportação identificado como brasileiro. A Bossa Nova É Foda, a faixa-título, Funk Melódico – referência ao funk carioca – e a festiva Parabéns são pontos altos e enérgicos do álbum, bem opostas ao tom muito melancólico da melhor canção e letra de todo o trabalho: Estou Triste.
Quilométrica, com 8 minutos, lenta e épica ao mesmo tempo, Um Comunista mistura fatos autobiográficos de Caetano com a vida do guerrilheiro baiano Carlos Marighella (1911-1969), que não tem o nome citado diretamente na canção.
Findo o ciclo roqueiro dessa parceria, já temos como fazer uma coletânea The Best of Caetano Veloso e BandaCê – e sair ouvindo no iPod contra o vento, sem lenço e com documento no sol de dezembro.
Fonte: Correio 24 horas