Publicado em 14/09/2022.
Batizado de Congênito, título de um clássico de Luiz Melodia, o quinto álbum solo do músico, compositor, arranjador e produtor Ricardo Bacelar é um projeto de intérprete. O músico cearense assume os vocais em canções de compositores como Lenine e Lula Queiroga (“O último pôr do sol”); Caetano Veloso (“A tua presença morena”); Gilberto Gil (“Estrela”); Belchior (“Paralelas”); Djavan (“Lambada de serpente”) e Chico Buarque (“Morena dos olhos d’água”), entre outros mestres. Congênito acaba de ser lançado nas plataformas de streaming com dois videoclipes, disponíveis no canal de Bacelar no YouTube. Ricardo conversou com a Abramus sobre o novo álbum e o desafio de gravá-lo sozinho, em seu estúdio.
1- Em Congênito, você é o intérprete de todas as canções e ainda o músico por traz de todos os instrumentos. Foi uma experiência solitária?
Congênito é fruto de um processo total de imersão. E quis gravar o disco sozinho, como uma espécie de test drive do meu estúdio, o Jasmin Studio, aqui em Fortaleza. Levei algum tempo estudando, fazendo pesquisas sobre a sala de gravação, aprendendo a operar os equipamentos. Fui fazendo laboratórios, experimentando as músicas, até chegar no repertório final. Foi um processo tão diferenciado que gravei um documentário mostrando os bastidores e todos os detalhes técnicos, que vou lançar em breve.
Para gravar sozinho todos os instrumentos é preciso uma boa dose de ousadia, coragem, muita perseverança e paciência. É como uma imagem que aos poucos vai tomando forma. Cada instrumento que se grava é como um tempero que você adiciona nesse caldeirão de sonoridades, texturas, climas e atmosferas diversas. Eu gosto que a música seja imprevisível, que surpreenda o ouvinte, que emocione e ao mesmo tempo traga algo de novo.
2- Sua carreira solo reúne álbuns basicamente instrumentais – como foi dar vasão ao lado seu lado de intérprete em Congênito?
O cantor e o instrumentista dialogam. A minha trajetória como cantor foi surgindo muito naturalmente. Na minha discografia eu tenho três faixas nas quais fiz vocais: um dueto com Délia Fischer, em “Nada será como antes”; o single “Vício elegante”, parceria minha com Belchior, e ainda “Oh mana deixa eu ir”, canção gravada no álbum “Sebastiana”. Na verdade, como integrante do Hanoi Hanoi eu já fazia vocais. Comecei a cantar algumas músicas nos meus shows e depois passei a exercer o canto como nova linguagem, a estudar canto e praticar. Então, isso veio de forma muito espontânea.
3- O repertório traz canções de épocas, compositores e influências variadas. Como ele foi montado?
si uma unidade, um conceito, além de uma estética original. Eu me apropriei do discurso, das letras e das músicas. Como eu cantei e toquei tudo, preferi não gravar músicas minhas, mas fazer um disco de intérprete. Geralmente eu canto a música com piano, ou violão, gravo a voz e inicio uma pequena pré-produção, para ver se a música funciona para mim, se me agrada. É um repertório denso, de música brasileira de qualidade, de autores que, em sua maioria, têm mais de 70 anos. Todas muito bonitas e algumas delas muito conhecidas. Acho que o primeiro conceito do disco é fazer a música que eu gosto, da qual eu preciso.
4- Sobre os arranjos de “Congênito”, quais foram mais desafiadores?
Os arranjos mais desafiadores foram os que têm muitos instrumentos de percussão. Na música “A tua presença morena”, por exemplo, usei muitos canais para as percussões. Tive que tocar várias vezes o mesmo instrumento para criar volume, como se fosse música de rua. Neste disco não temos nada sequenciado, loops pré-gravados ou feitos no computador: tudo foi tocado manualmente, com microfone, e gravado de forma acústica. Acho que consegui chegar à sonoridade e ao conceito musical que eu buscava. Me agradou muito.
5- Hoje você tem um selo fonográfico, o Jasmin Music, e o seu próprio estúdio. A ideia do selo veio primeiro, como foi o processo?
O processo do selo começou com o estúdio, que foi se desenvolvendo até tornar -se referência na América Latina por trazer muita tecnologia embarcada, como o Dolby Atmos. O projeto acústico é do WSDG, um dos escritórios mais importantes do mundo. No processo de construção do estúdio me veio a ideia do selo, para que eu possa gravar discos meus, além de trabalhos em parceria com outros músicos e artistas A ideia é poder exercer o ofício de produtor, músico e compositor de forma mais intensa, onde eu possa aprender ainda mais e mergulhar no processo de gravação, que é uma coisa que eu gosto muito. Antes de Congênito, que eu estou lançando, fiz o Paracosmo, com o Cainã Cavalcante, e o single De Passagem, com Toninho Horta. Na verdade, é muito apaixonante a ideia de desenvolver um catálogo de música de qualidade, é o que eu quero fazer. Meu projeto é que o selo tenha essa busca pela qualidade.